Há quase dois meses, nos deparamos com uma situação que exigiu processos de adaptação praticamente radicais em nossa forma de viver e aprender. Esse último termo é o que nos interessa no momento, considerando o aprender dentro de um contexto de formação profissional.
A aceleração, típica dos períodos de grave crise, alcançou enormemente a área educacional. De cinco anos para cá evidenciava-se, cada vez mais, o uso das tecnologias e das metodologias ativas em ambientes de aprendizagem, o que exigia readequação nas responsabilidades de tarefas atribuídas tanto a professores quanto a alunos. Professores e alunos são atores que protagonizam o ensino e a aprendizagem, no interior das salas de aula, daí a importância de se refletir sobre a maneira como o deslocamento no papel de ambos tem impactado a sua postura e conduta.
Ao professor, cuja responsabilidade anterior era preparar a aula a partir de sua perspectiva pedagógica, definindo qual conteúdo seria mais relevante a ser ensinado, solicitou-se que mediasse essa aprendizagem, observando, por meio da curiosidade do aluno, o que de fato deveria ser ensinado, mas em uma ótica diferente. Ao aluno, a quem cabia o papel de passivo ouvinte do conhecimento repassado pelo professor, tem-se exigido uma postura ativa e autônoma, na construção do seu próprio conhecimento.
Desse modo, o papel a ser desempenhado por ambos, exige a ressignificação do fazer pedagógico, para o qual, a idade, enquanto sufixo, precisa ser internalizada. Vamos entender melhor!
O primeiro ponto é a adaptabilidade, definida como aptidão ou propriedade daquilo que se demonstra adaptável; que pode se adaptar, porém, cuja adaptação necessita uma análise cuidadosa do contexto, sabendo extrair dele todas as experiências que sejam possíveis. Já vínhamos caminhando nessa trilha, adaptando-nos aos novos modelos de ensino a partir das metodologias ativas e da intensificação no uso de ferramentas tecnológicas, mas a situação imposta pela pandemia exigiu que essa postura fosse imediatamente implementada. Assim, alunos e professores precisaram, e continuam precisando, trabalhar na junção de esforços necessários para que a aprendizagem se concretize.
Essa habilidade leva à criatividade, capacidade de criar ou inventar, engenho, engenhosidade, inventiva. À grande parte dos professores, se não a todos, surpreende o fato de, em tão poucos dias, ter havido um preparo para o uso das tecnologias digitais do ensino remoto que, anteriormente, se fazia a passos relativamente lentos. E, literalmente ao mesmo tempo, exigiu-se dos professores que esse aprendizado se convertesse em modos criativos de se “entregar” o conteúdo de maneira não apenas a manter a atenção dos alunos, mas, sobretudo, a tentar garantir sua aprendizagem, bem como o desenvolvimento de habilidades e competências. Docentes que alcançaram com rapidez os resultados almejados, logo se tornaram cases de sucesso, inspirando e motivando outros professores a criarem estratégias semelhantes, ou ainda mais eficazes.
Em seguida, temos a flexibilidade/maleabilidade, definidos como capacidade para conseguir se dedicar a várias atividades ocupacionais e estudos. Ferramentas online, dispositivos, cursos e capacitações, exigem essa flexibilização, uma vez que o planejamento prévio teve que ser revisado e adequado ao momento. E, sendo essa adequação diária, pois estamos lidando com estudo remoto, ser flexível tornou-se uma condição nova ou, ao menos, ganhou novos contornos, em todo o contexto educativo. Uma situação é trabalhar com a EaD, que tem todo um programa definido. Outra situação é lidar com estudo remoto e aulas online, com inúmeros dispositivos que servem como suporte para auxiliar o aluno em seu aprendizado.
O que se exige do aluno, a partir de então? Muito mais do que saber acessar as redes sociais. Ele precisa saber como funciona uma plataforma, como realizar um trabalho colaborativo, como preencher um arquivo online, como se portar dentro de uma sala de aula virtual. Utilizando o termo comum, o aluno precisa colocar a mão na massa. Esse é um fator que pode conturbar um pouco o fazer estudantil, pois ainda vivemos experiências nas quais os alunos são passivos receptores e, ao serem exigidos que se tornem protagonistas do processo de aprendizagem, uma lacuna se mostra e as dificuldades emergem. Alguns podem desistir da formação, por acreditarem ser difícil, mas se usarem essa flexibilidade, verificarão que, em todo o tempo, seu sucesso sempre dependerá muito mais deles do que, especificamente, de um professor. Nesse sentido, a responsabilidade pode fazer toda a diferença.
Responsabilidade, definida como dever de se responsabilizar pelo próprio comportamento ou pelas ações de outrem; obrigação, é tarefa construída paulatinamente nas relações que estabelecemos e nos compromissos que assumimos e, aprender, é um compromisso que deve ser assumido tanto pelo docente quanto pelo discente. Porém, o ato de aprender está muito mais nas ações empreendidas pelo aluno do que pelo direcionamento do professor. Por mais que o educador ofereça as ferramentas necessárias e adequadas a esse processo, planejando as situações de aprendizagem ativa, se o aluno não quiser, no sentido de entregar-se e responsabilizar-se, infelizmente, pouco progresso conseguirá ser efetivado, a não ser aquele que já tiver acontecido. Uma vez que esses requisitos tenham sido trabalhados e compreendidos pelo sujeito em ação, podemos partir para a empregabilidade.
A empregabilidade é a capacidade que alguém possui para conseguir um emprego, buscando novas oportunidades de trabalho ou desenvolvendo maneiras de nele se manter. Dessa forma, exige-se que todas as “idades” acima tenham sido aprendidas e apreendidas pelo sujeito. O que propicia uma ligação direta ao fator do desenvolvimento das habilidades socioemocionais, demandadas pelo mundo do trabalho nos últimos anos e, de certo modo, testadas ao limite no período de afastamento social que estamos vivenciando.
Bates (2016), alertava que essas seriam as habilidades necessárias, na sociedade do conhecimento da era digital: comunicação; capacidade de aprender de forma independente; ética e responsabilidade; trabalho em equipe e flexibilidade; pensamento (pensamento crítico, resolução de problemas, criatividade, originalidade e elaboração de estratégias); competências digitais; e gestão do conhecimento. Conclui-se, portanto, que o período se tornou favorável para uma mudança no mindset dos professores, pois estão aprendendo a dominar as ferramentas tecnológicas e a assumir uma postura de mediação na construção das trilhas de aprendizagem dos alunos. Há muito o que avançar, do planejamento à avaliação, o percurso não tem sido simples nem fácil, mas pleno de possibilidades. As oportunidades, portanto, estão à mostra e caberá a cada professor e a cada aluno vivenciá-las com ousadia e criatividade suficientes para atravessar barreiras, inclusive as que pareciam intransponíveis há bem pouco tempo.
Por: Ana Lúcia Costa e Silva / Maria Teresa de Beaumont (Professoras do curso de Pedagogia)
REFERÊNCIAS
BATES, A.W. (Tony). Educar na era digital: design, ensino e aprendizagem. São Paulo, Artesanato Educacional, 2016, p.59-63.
DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA: MICHAELIS. Disponível em: michaelis.uol.com.br. Acesso em: 03 maio 2020.