É sabido que a maioria dos diplomatas brasileiros possuem formação jurídica. As Relações Internacionais constituem uma vasta área do conhecimento que contempla a história, geografia, economia, geopolítica, ciência política e direito. Um dos temas importantes abordados nesse campo é a Política Externa.
Entretanto, para falar sobre esse tema, é importante levantar algumas informações básicas. Embora a tradição acadêmica dos cursos de Relações Internacionais no Brasil tenha se consolidado tardiamente (no final do séc. XX), a casa das Relações Exteriores remonta ao período de constituição do próprio estado nacional brasileiro, principalmente a partir de 1902, quando Barão de Rio Branco assume a chancelaria.
Para além disso, o Itamaraty possui um corpo profissional de altíssima capacidade, com padrões de carreira, estrutura burocratizada e racional e quadros bastante desenvolvidos de organização e formação de pessoal (concursos extremamente concorridos). Consta-se também a autonomia alcançada e muito bem desempenhada pela instituição em sede de formulação de política externa, em decorrência da coesão e coerência corporativas.
É muito comum que as obras sobre o assunto citem a ‘estabilidade’ como um dos principais elementos de sustentação da P.E. E é justamente por esse motivo que a política externa, quando comparada com a política interna, caminha em um ritmo mais vagaroso, mais lento. Sempre vale a pena ressaltar: a política externa deve funcionar como um ‘amortecedor’ dos choques internos para a comunidade internacional, caso contrário, perde sua razão de ser. Como e em que grau esse amortecedor irá funcionar são determinações resultantes de um processo consolidado de racionalização das experiências existentes.
Nesse sentido, cabe realizar uma pequena análise sobre o quanto as relações determinadas pela Política Externa podem contribuir ou dificultar os debates relacionados à fruição de Direitos Humanos.
Em março de 2017 o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas promoveu a votação da Resolução da 34 Sessão (Agenda item 3) 71 que destaca a relação entre fruição de direitos humanos e política fiscal desenvolvida pelos países. Especificamente, a resolução visou prorrogar por mais três anos o mandato do Perito Independente (Independent Expert) sobre os efeitos do endividamento público sobre a fruição de direitos humanos. Ele é, em outras palavras, um representante da ONU responsável por monitorar os efeitos da dívida externa e outras obrigações financeiras internacionais dos Estados sobre a plena fruição de direitos humanos, especialmente os direitos econômicos, sociais e culturais.
Em um dos pontos salientados pela resolução, consta o reconhecimento de que a opção por determinadas estruturas de programas de reforma que imitam os gastos públicos dá atenção inadequada a promoção de serviços sociais. Além disso, a resolução afirma que apenas poucos países conseguiram alcançar maior crescimento sustentável quando aderiram esses programas de austeridade fiscal. O trecho da proposta de resolução referido foi o principal motivador do voto, dado pelo Brasil, contrariamente à aprovação do documento. Importante destacar que o Brasil, assim como outros países, tem desenvolvido várias políticas de austeridade e, nesse sentido, a resolução foi vista como oposta às reformas econômicas do governo.
Conforme a avaliação do Independent Expert escalado para investigar a situação brasileira, a Emenda 95 pode inviabilizar a fruição de Direitos Humanos no Brasil pelo tempo de sua duração. Esse tema pode ser melhor aprofundado em pesquisas realizadas no campo acadêmico científico. De toda forma já demonstra as possíveis relações entre Política Externa, Direitos Humanos e agenda econômica.
Por: Dra. Camilla Fernandes Moreira
Professora do curso de Direito